Quando a
gente pensa em distopias a gente pensa em mundos pós apocalípticos ou em mundos
completamente totalitários com governos e empresas tecnológicas dominando tudo.
Quando a gente pensa em distopias a gente olha pra nós mesmo e pra nossa
condição e pensa: “tá bom assim do jeito que tá”, mesmo sabendo que não tá nada
bom. É provável que as pessoas procurem na distopia uma paz de espirito que não
exista naquele momento em suas vidas. É provável
que as pessoas não entendam que a distopia é mais realidade que ficção.
Tecnologicamente
já somos todos controlados, celulares, computadores, contas de email, acesso
remoto, cartão de crédito, App de rastreamento, tá tudo aí e a gente convive
muito tranquilamente com tudo isso, uns mais e outros menos. Uma parcela da população
não tem nada disso e segue alheio as imposições que são feitas diariamente para
que se esteja conectado 24 horas por dia, mas bem, independente da pandemia que
nos assola hoje, esses também não viveram para sempre e as novas gerações que
virão terão internalizado que “Ser tecnologia” é praticamente a mesma coisa que
existir. Grandes distopias como as de Issac Assimov nos apresentam esse mundo
em que a tecnologia é praticamente o próprio existir, existiria algo para além
disso?
E nas
questões políticas, grandes obras falam em mundos destruídos, ou com poder
completamente centralizado. O que vemos hoje são políticos ou seus partidos por
10, 15, 20 anos no poder. Não é aquela ditadura distópica a que estamos
acostumados e ler em livros ou ver em filmes, mas aquela imagem de
totalitarismo nazista dos uniformes e bandeiras ou do Mad Max ou Tank Girl em
que as cidades vão sumindo e tudo vai se tornando cada vez mais hostil parece
bem longe de acontecer. O medo da ciência está aí, queimar livros não tem sido
uma realidade tão distante e o Fahrenheit é bem palpável. A religião evangélica
e as Jihads nos colocam diante de mundos totalitários muitos assustadores.
E seguem
outros modelos, distopias climáticas, distopias pandêmicas (como a atual), distopias psicológicas, distopias étnicas e raciais, distopias
temporais, distopias econômicas, são várias possibilidades, todas provém do
estado atual de utopia em que nos encontramos e a transformação nunca é sentida
a curto e médio prazo. Qual a maior distopia em uma sociedade capitalista e de
consumos? Não existir mais consumo? Não existir mais quem explorar? E quando não
existir mais o que explorar, qual será a nova utopia? Socialismo utópico? Anarquismo? E se pensarmos em distopias
de extermínio da humanidade, em que pequenos grupos se mantém vivos para
repovoar a terra (de novo, Mad Max e Tank Girl), que valores de hoje essas pessoas carregariam consigo para
essa nova sociedade distópica, afinal, os macacos de o Planeta dos Macacos sofrem dos mesmos vícios que os seres humanos atuais
e a sua distopia é mais espelho que ruptura. A distopia faz parte da utopia e
não está desvinculada desta, mas o que é utópico pra um pode parecer muito
distópico para outros.
São tempos de
transformações profundas, a distopia é a forma que a filosofia e arte encontraram
para fazer previsões do nosso futuro e assim olhar para nós mesmos. Do Jardim do Éden a Black Mirror
passando pela República de Platão ou o Inferno de Dante, utopia e distopia
estão ali, mas seria a utopia o futuro? Se a utopia é o lugar ideal que não é o
agora, qual seria esse lugar? O passado? Quem garante que o passado foi melhor?
E se a Utopia não é o agora, a distopia seria esse presente constante em que
vivemos ou essa infindável busca pelo passado? Somos seres distópicos por
natureza? Ou a maior distopia seria esse individualismo latente e o fim da
busca por progresso e de novas utopias? O tempo é esse arcabouço das histórias,
sejam elas reais ou ficcionais. Chegamos no limite? Queremos voltar, ignorar ou
esquecer tudo isso que está ai?
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